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quinta-feira, 21 de julho de 2011

Memória - entrevista a Thierry Stern, CEO dos relógios Patek Philippe

Thierry Stern – Presidente da Patek Philippe

Herança intemporal*

Fernando Correia de Oliveira

Thierry Stern é a quarta geração familiar a gerir a mais prestigiada manufactura relojoeira do mundo. O Presidente da Patek Philippe esteve recentemente em Portugal e falou connosco em exclusividade.

“É preciso ser um apaixonado da relojoaria para a poder dirigir, não é preciso ser um perito em marketing ou finanças. Na família, isso foi sempre claro – o testemunho passa para a geração seguinte apenas se temos o desejo, a paixão, fui eu que decidi, o meu pai não me pressionou”. Para Thierry Stern, a paixão despertou logo aos seis anos, quando manuseou os primeiros relógios de bolso, que o pai lhe passou para as mãos. Quanto ao futuro – os filhos de Thierry seguirão as suas pisadas, se assim quiserem, embora seja ainda cedo para falar disso (têm 6 e 8 anos). “A Patek é uma questão de paixão, não é uma questão de negócio”.

Cronos – Pilares do Tempo – Há uma frase célebre na vossa publicidade, dizendo que o possuidor de um relógio Patek Philippe não é verdadeiramente o seu dono, apenas o seu guardião para a geração seguinte. Ora, levado à letra, isso significa que, tendo eu um Patek, não vou comprar mais, nem para mim, nem para a minha família…
Thierry Stern – A frase também quer dizer que continuamos a fazer os nossos relógios de uma maneira que eles não passam de moda, que podem ser transmitidos de geração em geração. Mas, nisto tudo há sempre a paixão. É como nos automóveis – dizemos sempre “é o meu último carro!”, e no entanto… Na Patek temos essa filosofia, de criar coisas cada vez mais interessantes, que apaixonem. Não apenas nos movimentos, mas na estética. Para seduzir o cliente e continuar a alimentar a sua colecção. Até porque os nossos relógios são “valores seguros”, podem mesmo ser encarados como investimento.

Cronos – Pilares do Tempo – Os leilões são um indicador seguro para as marcas saberem quanto valem verdadeiramente no mercado. A Patek Philippe tem feito recordes sucessivos com relógios seus vendidos a preços cada vez mais elevados. Há mesmo clientes que nunca usam os seus Patek, apenas os guardam como investimento, lançando-os em leilão para realizar mais-valias. O que pensa disso?
Thierry Stern – Por um lado, ficamos muito orgulhosos, porque isso diz que a Patek Philippe representa um valor seguro, um produto de qualidade. Mas, na verdade, quando produzimos os nossos relógios, em momento algum pensamos nessa vertente. Um relógio Patek é concebido para ser usado no dia-a-dia, para estar no pulso e partilhar a nossa vida. Aos clientes que têm medo de os usar, porque por isso podem estar a tirar valor à peça, dizemos sempre que os nossos serviços são capazes de restaurar a 100 por cento, fazendo-a regressar ao aspecto de novo. Compreendemos o coleccionador, mas temos pena que o relógio não seja usado, é para isso que ele é criado, é para isso que nos esforçamos para que ele seja exacto a medir o tempo.

Cronos – Pilares do Tempo – A crise de 2009 foi particularmente severa para as marcas de médio preço. Mas todo o sector foi atingido. Como se passaram as coisas na Patek Philippe?
Thierry Stern – O que se passou connosco deve-se ao profundo conhecimento que o meu pai [Philippe Stern] tem do sector e da sua história. Pudemos antecipar a crise. No auge da euforia, no início de 2008, ele sentiu que as coisas não podiam continuar assim. Começámos a reduzir as entregas aos nossos retalhistas, embora não tenhamos reduzido a produção. Quando a crise chega, o essencial é controlar stocks, e nós estávamos preparados para isso, reduzimos o “sell in” e acumulámos nós stocks. Muitos retalhistas protestaram, pois nessa altura podiam vender muito mais relógios do que os que lhes fornecíamos, mas hoje agradecem-nos, pois conseguimos gerir stocks sem grandes problemas. Nisto tudo, o meu pai teve um papel essencial – já viveu três grandes crises no sector relojoeiro, soube prever o que se ia passar. E, na verdade, seis meses depois, a crise estava aí.

Cronos – Pilares do Tempo – Em termos técnicos e de forma, os últimos 20 anos foram revolucionários. Pequenas marcas avançaram com relógios de conceito, com novos materiais e novas formas de leitura do tempo. A Patek, como encara esse movimento?
Thierry Stern – Nós sempre tivemos a tradição de inovar. É por isso que somos líder no Topo de Gama. Não se pode continuar nessa posição se não formos inovadores. Quanto aos novos materiais, concentrámo-nos no silício. E quanto aos componentes do mecanismo, no escape, pois ele é o órgão essencial para a precisão de um relógio e é ainda possível melhorar muito o seu comportamento. O silício permite-nos fazê-lo – tem um quociente de atrito muito baixo, é amagnético. Há quatro anos que estamos a utilizar escapes de silício em alguns dos nossos modelos, já ultrapassámos a fase experimental, os relógios são muito mais precisos. Por outro lado, o silício pode ser utilizado na espiral e na roda de escape, em peças desenhadas por computador e cortadas num processo complexo mas muito preciso, uma espécie de fotocópia, tecnologia que não pode ser usada noutros materiais clássicos, como o aço. Na Patek, não estamos a falar de um gadget, de um concept watch, estamos a falar do futuro da relojoaria.

Cronos – Pilares do Tempo – Qual a percentagem de clientela masculina / feminina?
Thierry Stern – Estamos em cerca de 70 por cento de relógios masculinos e 30 por cento femininos. É uma percentagem que queremos manter. A Patek sempre fez, historicamente, mais relógios masculinos. Mas desde há dez anos, com o lançamento da linha Twenty Four, o mercado feminino cresceu muito.

Cronos – Pilares do Tempo – São relógios de quartzo.
Thierry Stern – Sim. Sempre ouvi dizer aos históricos da relojoaria que a mulher só quer relógios de quartzo. Mas penso que, se o homem fez a evolução do quartzo para as peças mecânicas e complicadas, também a mulher o pode fazer. Há hoje mulheres empresárias, que criaram os seus próprios negócios, que querem relógios mecânicos, isso também se tornou um símbolo para elas. Há aqui todo um novo mercado a explorar. Com o novo cronógrafo, estamos a ir nesse sentido – estreámos o calibre num modelo feminino.

Cronos – Pilares do Tempo – A Patek Philippe abandonou o selo de qualidade Poinçon de Genève e criou o seu próprio, “PP”, mais exigente. Que motivos levaram a isso?
Thierry Stern – Há vários anos que estávamos a estudar isso. Queríamos mostrar a diferença entre um produto de qualidade e um produto verdadeiramente excepcional. A Patek Philippe usou muito o Poinçon de Genève, mas ele tem um problema – não é evolutivo. Nos movimentos mecânicos, a Patek conseguiu ter toda a sua produção dentro desses parâmetros. Mas demo-nos conta de que fazíamos muito mais do que o exigido. O selo de qualidade de Genebra diz apenas respeito à estética, e nós achamos que, actualmente, a precisão também é muito importante. O Poinçon Patek responde a isso, diz respeito ao conjunto do relógio. E é evolutivo. Se as pessoas que criaram o Poinçon de Genève fossem hoje vivas, seriam os primeiros a apoiar a nossa decisão. Por outro lado, percebemos que algumas marcas estavam a aproveitar, nos últimos anos, o Poinçon de Genève como linguagem de marketing – produziam dez ou 50 relógios dentro desses parâmetros e diziam – “vejam, temos a qualidade Patek!”. Ora, isso é falso, a qualidade Patek vai muito para lá do Poinçon de Genève.

Cronos – Pilares do tempo – Alguém com 35 anos, com dinheiro suficiente para comprar um Patek Philippe, porque é que escolheria a marca, havendo hoje a explosão de modelos de novas marcas de Alta Relojoaria, com estéticas e campanhas de marketing mais arrojadas?
Thierry Stern – Esse tipo de consumidor vai informar-se antes de decidir. Hoje, através da Internet, tem acesso facilitado a todo o tipo de argumentos. Quanto a estilo, não podemos “forçar” a escolha. Mas a estratégia da Patek é de manter a mensagem constante – valor seguro, qualidade superior e controlada. Imprensa especializada, coleccionadores, consumidores finais são a nossa melhor publicidade. Não penso que estejamos em risco de perder clientes entre as novas gerações. Vivemos mergulhados em linguagem de marketing, mas são precisamente os jovens que estão melhor habilitados para a gerir, e distinguir… E nós estamos convencidos de que fazemos os melhores relógios do mundo.

*Entrevista conduzida em Lisboa, em 2010, aquando da visita de Thierry Stern a Portugal, por ocasião do 25º aniversário da David Rosas, representante exclusivo da marca no país. Foi publicada no suplemento do Público, Cronos - Pilares do Tempo, desse ano.

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